A médica Isabel Martinez explica o que é a condição, que atinge milhões de mulheres no Brasil
Descrita pela primeira vez em 1940, o lipedema ganhou um código no Cadastro Internacional de Doenças apenas em 2022. A doença atinge entre 10% e 18% das mulheres no mundo. No Brasil, são pelo menos 9 milhões de mulheres.
“Em uma viagem recente à Coreia, algo me chamou profundamente a atenção: ao observar as mulheres pelas ruas, não encontrei sinais clínicos que sugerissem lipedema. Essa percepção despertou uma reflexão importante. Por que será que, em países asiáticos, essa condição parece ser tão menos evidente? Pode ser apenas genética, mas também pode ser resultado de um estilo alimentar muito diferente do nosso. Essa soma entre genética e epigenética — a maneira como nossos hábitos influenciam a expressão dos nossos genes — talvez explique parte dessa diferença e merece ser investigada com cuidado e profundidade”, relata a médica Isabel Martinez.
Segundo a médica, o lipedema é uma doença crônica e inflamatória caracterizada pelo acúmulo desproporcional de gordura, especialmente em pernas, quadris e braços. “Ele não deve ser confundido com obesidade. O tecido adiposo envolvido no lipedema tem comportamento distinto, mais sensível, mais doloroso e menos responsivo às dietas tradicionais. É uma condição multifatorial, envolvendo fatores hormonais, genéticos, inflamatórios e comportamentais”, esclarece.
A médica ressalta que no tratamento, não existe solução única. “O que se observa na prática é que a combinação de estratégias traz resultados mais consistentes. A drenagem linfática costuma ser um dos primeiros passos importantes, pois prepara o tecido e reduz desconfortos. Terapias físicas, como radiofrequência e campo magnético — quando bem indicadas — podem contribuir para sensação de leveza, diminuição da dor e melhora da qualidade de vida. Exercícios de fortalecimento, mobilidade, o uso adequado de compressão e um padrão alimentar com menor carga inflamatória completam essa abordagem integrada. Sono regulado e manejo do estresse também são fundamentais, já que o corpo responde de forma direta ao nosso estado emocional e ao ritmo de vida”.
De acordo com Isabel Martinez, a suplementação pode ajudar, ela recomenda o uso com ressalvas. “É importante destacar que nenhum suplemento, sozinho, tem comprovação científica suficiente para tratar o lipedema. No entanto, alguns nutrientes podem atuar como coadjuvantes no controle da inflamação ou da sensibilidade dolorosa, como ômega-3, vitamina D, magnésio, curcumina e probióticos. Ainda assim, cada indicação deve ser personalizada, avaliando necessidades individuais e evitando promessas que não condizem com a realidade clínica”.
Ela destaca que outro ponto essencial é entender que mudanças de hábito exigem constância, e o cérebro humano nem sempre facilita esse processo. “Muitas vezes, a motivação não aparece, e é justamente por isso que a disciplina precisa vir antes. Como costumo orientar minhas pacientes: viva sob a obediência. Não espere a vontade chegar para começar. Faça o que precisa ser feito. A constância transforma o corpo antes da motivação”.
“A lipedema não é preguiça, não é falta de força e não é descuido. É uma doença que gera dor, impacto emocional e limitações reais. E, ao mesmo tempo, é uma condição que tem tratamento, tem caminhos possíveis e tem espaço para esperança — desde que com orientação adequada, cuidado contínuo e informação de qualidade”, conclui.